O atendimento oftalmológico infantil na rede pública brasileira finalmente retomou os níveis observados antes da pandemia de covid-19, um marco significativo para a saúde ocular das crianças e adolescentes no país. Segundo dados analisados pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), o número de consultas oftalmológicas no Sistema Único de Saúde (SUS) para essa faixa etária superou, de janeiro a junho de 2024, os patamares registrados no mesmo período de 2019. Esse cenário aponta para uma recuperação robusta dos cuidados com a saúde ocular de crianças e adolescentes, que foi seriamente impactada pela emergência sanitária global.
Com base na análise histórica, o CBO estima que, até dezembro de 2024, o número total de consultas oftalmológicas para crianças e adolescentes no SUS deve ultrapassar 2,1 milhões de atendimentos, superando o recorde registrado em 2019. Para a entidade, essa retomada sinaliza um retorno essencial dos cuidados oftalmológicos na faixa pediátrica, compreendendo crianças e jovens de 0 a 19 anos, uma parcela da população que teve seu acesso a serviços de saúde ocular drasticamente reduzido durante os anos de pandemia.
De acordo com o CBO, o primeiro semestre de 2019 registrou aproximadamente 1 milhão de atendimentos oftalmológicos para crianças e adolescentes na rede pública. No entanto, os anos subsequentes viram uma queda significativa, com o número de consultas variando entre 569 mil, em 2020, e 961 mil, em 2023. Esse declínio refletiu o impacto direto da pandemia, que restringiu o acesso a serviços de saúde não emergenciais. No entanto, o desempenho observado no primeiro semestre de 2024 indica que o Brasil está a caminho de romper com essa tendência negativa e avançar na prestação desse serviço essencial.
Os dados sobre o aumento das consultas oftalmológicas serão apresentados durante o 68º Congresso Brasileiro de Oftalmologia, que ocorrerá de 4 a 7 de setembro em Brasília, um evento que deve reunir especialistas e profissionais de todo o país para discutir os desafios e avanços na área.
A análise dos dados revela um perfil interessante no atendimento oftalmológico para a população de até 19 anos no Brasil. Entre janeiro de 2014 e junho de 2024, cerca de 43% das consultas oftalmológicas foram realizadas em crianças com menos de 1 ano de idade, totalizando 8.415.975 atendimentos. Em contraste, a faixa etária de 1 a 4 anos foi a que menos recebeu atendimento oftalmológico, com apenas 1.564.770 consultas, correspondendo a cerca de 8% do total. Esses números sugerem uma maior atenção aos cuidados oftalmológicos nos primeiros meses de vida, mas apontam também para a necessidade de ampliar o acesso para outras faixas etárias dentro da infância.
O CBO destaca que a saúde ocular de crianças e adolescentes deve ser tratada como uma prioridade tanto para as famílias quanto para os órgãos públicos. Problemas de visão não diagnosticados e, portanto, não tratados, podem comprometer gravemente o processo de aprendizagem e a socialização das crianças, com impactos duradouros em suas vidas.
Estima-se que o Brasil tenha cerca de 27 mil crianças cegas, muitas delas em decorrência de doenças oculares que poderiam ter sido evitadas ou tratadas precocemente. Os erros de refração não corrigidos, como miopia, hipermetropia, astigmatismo e presbiopia, são identificados como a principal causa de deficiência visual entre crianças brasileiras. Esses problemas não corrigidos podem influenciar negativamente o desempenho escolar e a sociabilização, resultando em impactos econômicos e sociais significativos.
Especialistas consideram fundamental a identificação e o tratamento precoce de casos de ametropia — a perda da nitidez da imagem na retina — para prevenir complicações como a ambliopia, popularmente conhecida como “olho preguiçoso”, que pode causar perda permanente da visão se não for tratada a tempo.
A triagem oftalmológica desempenha um papel crucial na detecção precoce de doenças oculares e na prevenção da cegueira infantil. Além disso, permite avaliar o perfil de erros refrativos na população, um aspecto relevante do ponto de vista de saúde pública. O CBO ressalta que a idade ideal para a triagem de problemas oftalmológicos é até os 6 anos, período em que o desenvolvimento visual da criança se completa.
Com a retomada dos níveis de atendimento oftalmológico infantil aos patamares pré-pandemia, o Brasil dá um passo importante para assegurar a saúde ocular das próximas gerações, garantindo que problemas de visão sejam identificados e tratados a tempo, contribuindo assim para o desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes do país.