A adoção tardia no Brasil continua a ser um processo desafiador, especialmente para crianças mais velhas e de minorias. A cidade do Rio de Janeiro tem se tornado palco de histórias que destacam a importância da “Busca Ativa”, um programa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que facilita a adoção de crianças e adolescentes com perfis que muitas vezes não são prioritários para os adotantes. Este programa auxilia famílias a encontrarem crianças fora do perfil tradicionalmente procurado. Recentemente, a história de Thalysson Barbosa, de 14 anos, adotado por Bruna Campos e seu marido Marlon, traz uma visão positiva e impactante sobre o sucesso do programa.
Em uma rua calma e arborizada em Campo Grande, zona oeste do Rio de Janeiro, Thalysson agora encontra segurança ao lado de sua nova mãe, Bruna Campos, de 35 anos. O casal entrou para o grupo de apoio à adoção Cores da Adoção e expandiu seu perfil de preferência para adoção tardia. “O grupo nos orientou sobre diversidade e ajudou a redefinir nosso perfil”, explica Bruna, que lembra o dia em que viu Thalysson pela primeira vez. “Quando colocaram a foto dele no grupo, decidimos conhecê-lo. Desde então, nossa vida mudou completamente”.
A Busca Ativa Nacional é uma iniciativa do CNJ para promover a adoção de crianças fora do perfil comum — principalmente meninos negros e adolescentes. Dos mais de 5 mil jovens aguardando adoção no Brasil, cerca de 69,5% são negros, e a maioria possui entre 10 e 16 anos. Somente em 2024, 307 das 3.409 adoções realizadas foram realizadas por meio da Busca Ativa, representando cerca de 9% do total de adoções no período.
A jornada do casal Campos para adotar Thalysson passou por uma série de etapas emocionantes. Logo após a visita ao abrigo onde o menino estava, começaram as visitas semanais e, eventualmente, puderam passear com ele. Em julho, Thalysson passou uma semana na casa dos Campos durante as férias escolares, fortalecendo o vínculo com o casal. Em agosto, a guarda legal foi concedida.
Bruna, que está grávida de quatro meses, comenta sobre a nova dinâmica familiar: “Eu sempre imaginei que seria amor à primeira vista, mas a adoção é um processo de convivência. Hoje, sinto um amor tão intenso que não consigo imaginar minha família sem ele”.
No Brasil, o perfil dos jovens para adoção é marcado por características que frequentemente dificultam sua colocação. Meninos negros, filhos de mães solo e crianças com mais de 5 anos enfrentam barreiras adicionais. A psicóloga social e professora Lygia Santa Maria Ayres ressalta: “Essas crianças vêm de contextos de vulnerabilidade e são as mais desamparadas pelas políticas públicas”.
De acordo com o CNJ, muitos adotantes priorizam crianças que se assemelhem fisicamente a eles e que sejam brancas ou pardas. Além disso, o sistema possui cerca de 35.631 pretendentes à adoção, mas a maioria prefere crianças até 8 anos de idade. Essa preferência reduz significativamente as chances de adoção para crianças mais velhas. Outra barreira é a resistência em adotar grupos de irmãos ou jovens com alguma deficiência.
Para a professora Ayres, é fundamental que o Estado invista em políticas públicas que facilitem o acesso à educação, à saúde e à moradia para mães solo, permitindo que essas mulheres tenham condições de criar seus filhos. “Oferecer creches e empregos é uma forma de garantir que essas crianças possam ficar com suas mães, reduzindo o número de menores em abrigos”, conclui a professora.
Os jovens no sistema enfrentam um sentimento profundo de abandono e rejeição. Ao completarem 18 anos, eles são desligados do sistema de adoção e precisam construir suas vidas sem o apoio de uma família. “Esses adolescentes são muitas vezes mal escolarizados e possuem poucas perspectivas de futuro. Ao serem desconectados da assistência estatal, enfrentam grandes desafios sociais”, analisa a professora Ayres.
A história de Thalysson e da família Campos é um exemplo de sucesso e superação. Programas como o Busca Ativa abrem novas oportunidades para milhares de crianças e adolescentes que esperam uma família, ao mesmo tempo que evidenciam a necessidade de mudanças no sistema de adoção. Para que mais histórias como a de Thalysson se tornem realidade, é essencial ampliar o perfil de adoção e promover políticas públicas que fortaleçam famílias em situação de vulnerabilidade.
Fonte: Agência Brasil