Anielle Franco, atual ministra da Igualdade Racial, enfrenta os desafios do racismo digital e das violências contra comunidades vulneráveis com um olhar pessoal e profissional marcado pela tragédia familiar. Após o brutal assassinato de sua irmã, a vereadora Marielle Franco, em março de 2018, a família Franco foi vítima de uma campanha de desinformação. Falsas imagens de Marielle associadas a criminosos circularam na internet, ampliando a dor do luto. Esse episódio impulsionou a visão de Anielle sobre a necessidade urgente de mecanismos que protejam as pessoas das consequências da desinformação e do preconceito nas redes sociais. Agora, como ministra, ela vê na educação digital e na regulação das redes sociais ferramentas indispensáveis para combater o racismo e a desigualdade no ambiente online.
Durante o festival de tecnologia Rec’n’Play, realizado em Recife (PE), Anielle falou sobre a importância da educação digital e do acesso democrático à internet. “A saída, ao meu ver, é primeiro uma discussão séria sobre quem acessa e quem não acessa (a internet). Segundo, é se letrar nas escolas e ter acesso também na própria escola”, afirmou a ministra em entrevista à Agência Brasil. Ela destacou que é necessário reforçar o acesso à internet em todas as escolas públicas, especialmente nas periferias, como uma política de garantia de direitos fundamentais. Para Anielle, a inclusão digital é essencial para fortalecer o aprendizado e preparar as novas gerações para lidar criticamente com a tecnologia.
Anielle acredita que a inclusão digital deve ser garantida pelo Estado, especialmente para pessoas de baixa renda, negras e habitantes de favelas, que frequentemente não possuem acesso adequado à internet. Ela vê na inteligência artificial uma ferramenta poderosa, mas aponta que os algoritmos e pesquisas ainda carregam preconceitos estruturais, reflexo do perfil dos desenvolvedores. “Os vieses racistas nas pesquisas com inteligência artificial mostram quem está programando ali atrás”, observou a ministra. Ela defende que, com investimento na educação de base e políticas de inclusão, o cenário pode ser transformado.
A ministra descreve a necessidade de “regular, fortalecer e implementar” ações que democratizem a tecnologia e promovam o letramento digital em todas as camadas da população. Lembra ainda que o problema do acesso é estrutural e não pode ser resolvido por uma única entidade. “O Ministério da Igualdade Racial tem uma ação transversal. A gente não tem condições nem faria nada sozinho sobre esse tema”. Durante a pandemia, ela testemunhou a dificuldade dos alunos das comunidades da Maré e Manguinhos, que dependiam da escola para acessar a internet. Esse contexto reafirma a importância de um plano de letramento digital inclusivo e acessível para a população.
Além das questões urbanas, Anielle Franco também expressa preocupação com a violência sofrida por comunidades quilombolas, onde o racismo e o abandono estatal ainda são realidades. A ministra relembrou a trágica morte de Bernardete Pacífico, uma líder quilombola assassinada em Simões Filho (BA) no ano passado, para ilustrar a falta de proteção adequada para ativistas e defensores dos direitos humanos. Segundo ela, o programa de proteção para essas lideranças precisa ser aprimorado e atualizado. “Eu mesma faço parte [do programa]. A realidade desse acompanhamento diário, às vezes, é ineficaz. Precisa ser reformulado”, declarou.
Para enfrentar esses desafios, Anielle menciona a criação do programa “Aquilomba Brasil”, que visa promover políticas públicas de inclusão e proteção para comunidades quilombolas. Ela enfatiza que melhorar as condições de vida e segurança dessas populações requer uma aliança entre diferentes instâncias do governo e apoio das autoridades estaduais e municipais. “O atendimento das demandas precisa de interesses conjuntos e também vontade política conjunta. Mas a gente tem acompanhado para tentar melhorar a situação”, afirmou.
A ministra também acredita que a regulamentação das redes sociais e da inteligência artificial é essencial para combater o racismo online. Ela destaca que as plataformas digitais, quando desregulamentadas, se tornam campos férteis para a disseminação de conteúdo racista e desinformação, perpetuando estereótipos e violências. Segundo Anielle, a democratização do acesso à internet e o letramento digital nas escolas podem ajudar as novas gerações a serem mais críticas e a reconhecerem os vieses discriminatórios presentes em muitos conteúdos online.
Anielle Franco conclui que a transformação social pela qual ela luta só será possível com o compromisso do Estado em prover acesso digital equitativo, proteger as populações mais vulneráveis e garantir que a tecnologia seja um instrumento de justiça e inclusão. Ela acredita que a educação é o pilar dessa mudança, e que políticas robustas de inclusão e proteção precisam ser implementadas para combater a desigualdade digital.
Fonte: Agência Brasil