O mês de dezembro chega a Manaus sob calor intenso, com uma seca histórica no Amazonas que já é considerada a pior de todos os tempos. O nível dos rios está dramaticamente baixo, expondo ilhas e trechos de terra que deveriam estar submersos. Os efeitos desse fenômeno são sentidos em todas as esferas sociais e econômicas, especialmente no turismo, setor vital para a região.
Para Rodrigo Amorim, guia turístico e capitão de lancha que opera no rio Negro, a estiagem trouxe desafios significativos. “Os ribeirinhos que dependem do turismo, da pesca e dos restaurantes estão sofrendo muito. Muitas atividades, como a pesca do pirarucu e os passeios de focagem de jacaré, praticamente pararam. Até o transporte dos turistas pelos rios ficou complicado, já que vários trechos se tornaram inavegáveis”, explica.
A situação é igualmente difícil para Daniel Hanrori, líder indígena do povo Tukano. Ele coordena uma aldeia próxima ao Lago Janauari e relata as dificuldades enfrentadas pelas 38 pessoas que vivem da venda de artesanato e do turismo. “No período de cheia, recebíamos até 60 lanchas por dia. Agora, são apenas duas. Dependemos do turismo e da pesca, mas ambos foram gravemente prejudicados pela seca”, conta Daniel, que também enfrenta desafios para manter condições básicas de vida na aldeia.
A crise climática transformou o turismo na Amazônia. O emblemático encontro dos rios Negro e Solimões, um dos passeios mais famosos da região, perdeu parte de sua atratividade devido à baixa dos rios, que prejudica a visualização do fenômeno. Outras atrações, como a Praia de Ponta Negra e o Museu do Seringal, foram interditadas ou fechadas temporariamente.
A situação não é exclusiva do Amazonas. Em Alter do Chão, no Pará, a baixa do rio Tapajós dificultou o acesso a ilhas e restaurantes, enquanto festivais tradicionais como o Sairé tiveram de ser suspensos.
Isabel Grimm, especialista em meio ambiente e desenvolvimento, ressalta a necessidade de reavaliar o turismo de massa. “O setor turístico é responsável por emissões significativas de gases do efeito estufa, principalmente pelo transporte aéreo. Além disso, o consumo excessivo de água e energia nos destinos turísticos causa impactos consideráveis. É preciso adotar modelos mais sustentáveis, que reduzam esses danos e valorizem comunidades locais”, pontua.
Na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, no Amazonas, o Instituto Mamirauá promove, desde 1998, um programa de turismo de base comunitária que alia preservação ambiental ao desenvolvimento local. A Pousada Uacari, principal atração do projeto, oferece experiências imersivas na floresta e beneficia diretamente 11 comunidades locais.
Pedro Nassar, coordenador do programa, destaca as diferenças entre o turismo comunitário e o turismo de massa. “Aqui, os moradores participam ativamente da gestão e planejamento das atividades. Os benefícios gerados são distribuídos entre a comunidade, tanto econômicos quanto sociais e ambientais”, explica.
O modelo também inspira iniciativas em outras regiões, como no Jalapão, Tocantins, onde Ilana Ribeiro Cardoso lidera esforços para implementar práticas de turismo sustentável. “O turismo comunitário é essencial para evitar impactos ambientais graves e preservar nossas riquezas naturais. Ele envolve cuidado e respeito pela terra, algo que somente as comunidades locais podem oferecer”, afirma a artesã.
Com as mudanças climáticas tornando-se mais severas, o turismo na Amazônia precisa se reinventar para sobreviver. Especialistas e lideranças locais defendem políticas públicas que incentivem modelos sustentáveis e capacitem comunidades para atuar no setor.
“A Amazônia tem uma biodiversidade única e rica. Valorizar o turismo comunitário é essencial para preservar esse patrimônio e gerar desenvolvimento econômico local”, conclui Isabel Grimm.
Fonte: Agência Brasil