O Acampamento Terra Livre (ATL) 2025 começou neste domingo (6) em Brasília com a chegada de milhares de indígenas de todas as regiões do Brasil, que se reúnem na capital federal em defesa da demarcação de seus territórios tradicionais. A expectativa é que cerca de 10 mil indígenas participem da maior mobilização anual dos povos originários do país, com uma programação intensa de atividades, manifestações, debates e articulações políticas entre os dias 7 e 11 de abril.
O evento, que ocorre no espaço da Funarte, é promovido pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e nesta 21ª edição adota o tema: “A resposta somos nós: Em defesa da Constituição e da vida”. Com a presença de mais de 200 povos, o ATL se torna um espaço de resistência e protagonismo político dos povos indígenas diante das ameaças aos seus direitos constitucionais.
Nas barracas montadas, o som do português se mistura com as mais de 270 línguas indígenas faladas no Brasil. É o caso de Andrea Nukini, 44 anos, que percorreu uma longa jornada de quatro dias e quatro noites de ônibus desde sua aldeia, no povoado Nukini, em Mâncio Lima, no Acre. Para ela, a luta pela terra segue inacabada.
“A nossa luta nunca acaba, porque a gente nunca tem o território totalmente nosso e demarcado. Era para todos nós, povos indígenas, termos nossos territórios demarcados, como manda a Constituição há mais de 35 anos. Mas isso não acontece”, afirma a liderança Nukini.
Entre os principais focos do ATL 2025 está a rejeição ao Marco Temporal, tese jurídica que restringe a demarcação de terras apenas às áreas ocupadas por povos indígenas em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Apesar de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter declarado a tese inconstitucional em 2023, o Congresso Nacional aprovou uma lei favorável à tese, reacendendo a disputa jurídica.
A coordenadora-secretária da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Marciely Tupari, criticou a mesa de conciliação proposta pelo ministro Gilmar Mendes, relator do caso no STF, e que contou com a participação de representantes do agronegócio e da mineração.
“O movimento indígena definiu que estar nesse espaço era validar o que o Gilmar Mendes estava propondo, e uma das propostas era a mineração em territórios indígenas, o que sempre fomos contra. Não fazia sentido debater nossos direitos para liberar nossos territórios para empreendimentos. Nossos direitos não são negociáveis”, afirmou Marciely.
Ela destacou ainda os impactos negativos da mineração para os povos originários: “A gente tem exemplo do impacto que a mineração traz para dentro dos territórios e dos nossos rios, como ocorre com os Yanomami e os Munduruku. Os parentes estão sofrendo com a desnutrição, com mercúrio dentro do corpo, os peixes estão contaminados”.
Além da luta contra o Marco Temporal, o ATL busca fortalecer a articulação política dos povos indígenas rumo à COP30, a conferência da ONU sobre mudanças climáticas, que ocorrerá em novembro deste ano em Belém (PA). O objetivo é apresentar uma Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) indígena, contrapondo-se à versão oficial brasileira apresentada na última conferência.
“A gente está se articulando também para fazer, por exemplo, uma NDC indígena, para se contrapor à NDC que o governo lançou na COP do ano passado, quando ele não introduziu os problemas que o agronegócio traz para as mudanças climáticas”, explicou Marciely Tupari.
As NDCs são compromissos assumidos pelos países signatários do Acordo de Paris para a redução de emissões de gases de efeito estufa. O governo brasileiro prometeu reduzir em 53% suas emissões até 2030, mas organizações indígenas cobram a inclusão dos impactos do desmatamento e da expansão do agronegócio nessa equação.
Durante os cinco dias do ATL, as lideranças devem realizar marchas, rodas de conversa, plenárias e atos públicos no Congresso Nacional e em ministérios. A intenção é fazer valer os direitos constitucionais, garantir a integridade dos territórios indígenas e resistir ao avanço de projetos legislativos e econômicos que ameaçam as comunidades originárias.
“O ATL é muito mais do que um acampamento. É a demonstração de que os povos indígenas estão vivos, conscientes de seus direitos e prontos para defender a vida e a natureza. A resposta somos nós”, reforça a organização do evento.
Fonte: Agência Brasil