A inédita expedição à Antártica, liderada por pesquisadores brasileiros, marca um novo capítulo na ciência polar ao realizar a primeira circum-navegação completa do continente gelado. A bordo de um navio quebra-gelo russo, a missão partiu do Rio Grande do Sul no dia 22 de novembro e conta com a participação de 61 cientistas, incluindo 27 de universidades brasileiras e representantes de Rússia, China, Índia, Argentina, Chile e Peru.
O objetivo principal é coletar amostras de gelo, água e ar em uma jornada de 14 mil quilômetros ao redor da Antártica, contribuindo para a compreensão das mudanças climáticas e seus efeitos. “Estamos visualizando, nas regiões polares, as mudanças mais rápidas e intensas do clima, que afetam o nosso cotidiano”, afirmou Jefferson Cardia Simões, professor do Centro Polar e Climático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e coordenador da missão.
O navio quebra-gelo utilizado pela expedição, pertencente ao Instituto de Pesquisa Ártica e Antártica da Rússia, é uma embarcação de 130 metros capaz de romper camadas de gelo de até 2 metros de espessura. Essa tecnologia permite que os cientistas se aproximem da costa do continente, ampliando as possibilidades de pesquisa.
A circum-navegação terá início oficial em 4 de dezembro, com previsão de término em 12 de janeiro, quando a equipe chegará à Ilha Rei Jorge, próxima à Estação Antártica Comandante Ferraz, operada pela Marinha do Brasil. O retorno à cidade de Rio Grande está programado para ocorrer entre os dias 23 e 25 de janeiro.
A missão é dividida em três principais áreas de estudo: monitoramento das calotas de gelo, análise climática e detecção de microplásticos. Essas pesquisas buscam desvendar como o gelo da Antártica está respondendo às mudanças climáticas e quais impactos isso pode ter globalmente.
“Nós já observamos o desaparecimento de plataformas de gelo flutuantes há mais de 20 anos. Isso pode resultar no aumento de 6 a 7 metros no nível do mar em até 300 anos, com consequências severas, como a submersão de cidades costeiras”, explicou Jefferson Simões.
As amostras coletadas incluem neve compactada, que guarda informações sobre condições climáticas do passado, água para detecção de microplásticos e poluentes, além de ar para estudos atmosféricos. Esses dados são essenciais para medir a velocidade do derretimento das geleiras e prever impactos no nível do mar.
O trabalho colaborativo envolve não apenas os 61 cientistas a bordo, mas também equipes em terra, como a professora Rosemary Vieira, da Universidade Federal Fluminense (UFF). Ela acompanha a expedição remotamente e explica a relevância do trabalho: “Os sedimentos coletados podem revelar mudanças ambientais que ocorreram milhares de anos atrás, ajudando a entender o que está por vir”.
Além disso, a missão destaca a importância da “diplomacia da ciência”, como enfatizou Jefferson Simões. A coordenação de pesquisadores de sete países, com diferentes idiomas e culturas, é um exemplo de cooperação internacional em prol de interesses comuns.
Embora remota, a Antártica é um dos principais reguladores climáticos do planeta. O que acontece no continente gelado afeta diretamente o Brasil, influenciando o regime de chuvas e as temperaturas, elementos fundamentais para a agricultura e outros setores.
“A Antártica está conectada a todos os oceanos e tem reflexos diretos em nosso cotidiano. Compreender suas mudanças é essencial para prever e mitigar os impactos das alterações climáticas no restante do mundo”, concluiu Rosemary Vieira.
Com descobertas previstas para serem divulgadas ao longo dos próximos anos, essa expedição representa um marco na ciência climática global e reforça o papel do Brasil como protagonista na pesquisa polar.
Fonte: Agência Brasil