Oficina de escrita e slam foi o caminho que o poeta e arte-educador Rafael Moreira, também conhecido como Viajante Lírico, encontrou para transformar sua trajetória em ponte para outras juventudes. Morador de Paciência, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro, Rafael teve seu primeiro contato com a cultura hip-hop ainda nos tempos de escola, e esse momento seria determinante para moldar não apenas sua carreira artística, mas também seu propósito social.
“Era um festival de hip-hop. Juntava uma galera que dançava, que recitava poesia, que já estava envolvida com batalha de rima e tudo mais”, relembra. O evento foi promovido por uma professora de história e, mais do que entretenimento, funcionou como um marco em sua formação. Foi ali que Rafael entendeu que poderia ser um multiplicador da arte urbana, levando para outras escolas e espaços periféricos aquilo que vivenciou como estudante.
Dessa semente nasceu o projeto “Oficina de Escrita e Slam”, desenvolvido em parceria com a Editora Ascensão. A iniciativa integra um projeto maior criado por Rafael em 2015: o Ocupa Hip-Hop, que tem como objetivo central mobilizar, ensinar e inspirar jovens através da cultura hip-hop, tratando-a como ferramenta de transformação, conscientização e empoderamento social.
“A arte tem esse papel fundamental de atuar junto com a educação e transformar. Ela faz com que uma pessoa pense de forma mais crítica e passe a acreditar nos próprios sonhos”, afirma o multiartista, que também passou pela Academia Brasileira de Letras, em curso promovido em parceria com a Universidade das Quebradas e a Festa Literária das Periferias (Flup).
O hip-hop como ferramenta pedagógica
O Ocupa Hip-Hop baseia-se nos elementos da cultura urbana — rima, grafite, break dance, discotecagem — para propor práticas educativas. Com uma abordagem que une teoria e vivência, o projeto transforma as batalhas de rima em arenas de pensamento. O foco é desenvolver competências como argumentação, organização de ideias, oralidade e liberdade de expressão.
“Espaços como as batalhas e o slam se tornaram canais de desabafo, de externalizar sentimentos e pensamentos. São ambientes de identificação, onde as pessoas se veem representadas. E isso gera um impacto muito forte”, explica Rafael.
Ele destaca ainda que o Ocupa Hip-Hop começou em escolas, mas se expandiu para universidades e outras instituições, ao perceber que diferentes faixas etárias também precisavam daquele conteúdo. “Hoje entendemos que a potência do hip-hop não tem idade. Todos precisam de espaços que validem suas vozes”, completa.
Escrever, sentir e publicar
Uma das ramificações mais recentes do projeto é a Oficina de Escrita Criativa e Slam, realizada no Instituto Via Solidária, em Campo Grande. Com duração de seis meses, as aulas ocorrem às quartas-feiras e são estruturadas em ciclos mensais. Nas três primeiras semanas, os alunos vivenciam práticas de escrita e mergulham nos fundamentos do slam. Na última semana do mês, participam de um bate-papo com autores convidados que compartilham suas experiências no universo literário.
“Queremos criar um ambiente onde os jovens não apenas aprendam técnicas, mas também se reconheçam como autores. Por isso, a presença desses convidados é tão importante. É o momento em que teoria e prática se encontram, com exemplos vivos de que é possível viver de literatura”, ressalta o poeta.
Durante o percurso, os estudantes exploram desde a história da poesia falada até estratégias de performance, desenvolvendo um repertório artístico e pessoal. Ao fim da oficina, os textos produzidos são reunidos em uma antologia a ser lançada pela Editora Ascensão. A publicação, segundo Rafael, representa mais do que um encerramento: simboliza o nascimento de novos escritores.
“É uma maneira de mostrar para esses jovens que sua escrita tem valor, que eles podem ser publicados, reconhecidos e até profissionalizados. A oficina quer deixar claro que é possível viver de arte, que escrever pode ser mais do que um hobby. Pode ser uma profissão, uma missão de vida.”
O projeto, ao entrelaçar educação, arte e identidade periférica, vem promovendo mudanças reais na autoestima e na projeção de futuro de seus participantes. Com base no hip-hop, o Ocupa oferece não apenas oficinas, mas espaços de escuta, criação e pertencimento — ingredientes fundamentais para a construção de um novo imaginário sobre juventudes, literatura e possibilidades.
Fonte: Agência Brasil